quarta-feira, 8 de setembro de 2010
Angola: Um País Sem Problemas
OUVIR:
Não há nada mais prejudicial ao novo rumo de Angola do que o complexado hábito de procurarmos passar, forçosamente, ao mundo a enganadora imagem de sermos um país perfeito e pacificado. O nosso famigerado orgulho não tolera que as pessoas digam que Angola ainda tenha os típicos problemas de um país do chamado Terceiro Mundo. Para os patriotas mais exaltados Angola é, hoje, um país sem problemas e que se afirma, definitivamente, como uma grande potência.
Não há nada mais prejudicial ao novo rumo de Angola do que o complexado hábito de procurarmos passar, forçosamente, ao mundo a enganadora imagem de sermos um país perfeito e pacificado. O nosso famigerado orgulho não tolera que as pessoas digam que Angola ainda tenha os típicos problemas de um país do chamado Terceiro Mundo. Para os patriotas mais exaltados Angola é, hoje, um país sem problemas e que se afirma, definitivamente, como uma grande potência.
Por exemplo, sabemos todos que a corrupção é um dos graves problemas de Angola. Rafael Marques assumiu o risco de denunciar alguns esquemas de corrupção considerados crimes nos países sérios e democráticos. Mas o Jornal de Angola diz que é tudo mentira. Em África, Angola é um exemplo a seguir e que o Rafael Marques não passa de um corrupto ao serviços de organizações estrangeiras que insistem em atacar, de forma tão baixa, a soberania de Angola e a honra dos seus governantes.
Toda a gente sabe que Angola é um país ensombrado pelas profundas desigualdades socioeconómicas. Temos a vergonhosa fama de sermos um país onde a riqueza ostensiva de alguns privilegiados convive lado a lado com a pobreza extrema da maioria. Mas o Jornal de Angola diz que é tudo mentira. Somos um país de respeito. Muitos líderes africanos fazem tudo para adoptar o nosso modelo. Na Europa temos o respeito dos países da União Europeia. Os Estados Unidos da América estreitam cada vez mais as relações com Angola. Os especialistas do FMI estiveram no nosso país e deram nota excelente ao desempenho da nossa economia.
Todo o mundo sabe que os dirigentes angolanos têm fracassado na promoção do desenvolvimento harmonioso do País e na criação de condições que contribuam para o bem-estar físico e espiritual de todos os angolanos. Toda a gente sabe que Angola é orgulhosa dona de um dos mais inoperantes modelos de Estado, de uma das mais ineficazes estruturas de gestão governativa e de um dos mais corruptos aparelhos de administração pública. Mas o Jornal de Angola diz que é tudo mentira. Tudo não passa de uma conspiração das organizações que mais se destacam na guerra contra a honra da pátria e dos seus dirigentes. Porque os países influentes, os líderes respeitados e as instituições que sabem avaliar o desempenho dos governos e das economias, estão sempre a elogiar o desempenho do nosso Presidente da República, do Executivo e das principais figuras da política angolanas.
Mas, afinal, onde andam os problemas de Angola? É que um pouco antes de 4 de Abril de 2002 éramos, ainda, cotados como um dos mais problemáticos países do mundo.
A difícil procura das razões do estranho desaparecimento dos graves problemas da nossa sociedade levou-me a viajar no tempo e rever um dos mais bizarros comportamentos da minha memorável infância.
Quando éramos miúdos púnhamos as nossas aprazíveis brincadeiras acima de quaisquer outros aspectos considerados importantes da nossa vida em sociedade. Aliás, é hoje ponto assente e unânime considerar a brincadeira como um dos aspectos fundamentais do desenvolvimento da criança. Mas, os nossos zelosos encarregados de educação não entendiam assim. Por isso, desde cedo, queriam fazer-nos «maduros» e «responsáveis», obrigando-nos a eleger os estudos e as lides domésticas como prioridades absolutas.
Não era, por isso, de estranhar que tivéssemos desenvolvido fortes resistências aos trabalhos domésticos. Assim, mal vínhamos da escola, partíamos logo para a gostosa diversão. E durante as férias chegávamos a desaparecer o dia inteiro. Só que os «inimigos» da brincadeira não dormiam em serviço. Estavam sempre atentos às nossas minuciosas manobras. Assim, mal se apercebiam da nossa fuga aos sagrados deveres, procuravam agir de imediato. E o pior de tudo é que era, sempre, no auge da brincadeira que os zelosos encarregados de educação gostavam de nos chamar ou ir buscar para arrumar e limpar a casa, lavar a loiça, varrer o pátio, levar recados, etc., etc.
E perante a inevitabilidade da autoritária chamada, os mais medrosos abandonavam a brincadeira voluntariamente contrariados. Para os mais duros, abandonar a diversão era um acto tão difícil que só saíam dela sob dolorosas séries de «cocos» na cabeça ou forçosamente arrastados pelos impulsos dos puxões de orelhas.
Por tudo isso, era óbvio que chegássemos à casa sem a mínima motivação para cumprir os sagrados deveres impostos pelos «inimigos» da brincadeira. E não era, por isso, de estranhar que, no momento de executar as lides da casa, e no claro intuito de apenas satisfazer as caprichosas exigências dos zelosos encarregados de educação e para, rapidamente, podermos voltar à diversão, fizéssemos tudo mal e às pressas.
Assim, ao arrumarmos a casa, muito lixo era atirado para debaixo dos tapetes e das camas ou deixado detrás das portas. Só limpávamos o pó dos objectos absolutamente visíveis. Apenas passávamos o pano do chão nas superfícies mais usadas. E ao varrer o quintal ou o passeio, o mais pequeno buraco ou arbusto servia para esconder o lixo.
Pois é, meus caros. As razões que estão por detrás do súbito e estranho desaparecimento dos graves problemas da nossa sociedade são muito semelhantes aos bizarros comportamentos da minha memorável infância. Porque pelos vistos, ainda continuamos a colocar a diversão acima de quaisquer outros aspectos importantes da nossa vida em sociedade. Está a custar-nos deixar de brincar aos «bons governantes», aos «grandes países», aos «cowboys», à «estátua ninguém lhes mexe», à «bica oposição», ao «povo cego», ao «caçumbula as riquezas de Angola», ao «35 vitória de alguns», etc.
Quando nos chamam para «arrumar» e «limpar» a nossa problemática sociedade comportamo-nos como crianças contrariadas por deixarem a gostosa brincadeira. Assim, e no claro intuito de, apenas, impressionar e satisfazer as exigências dos estrangeiros que vivem entre nós, negoceiam com os nossos dirigentes, colaboram com as instituições da nossa sociedade e visitam o nosso intrigante país, temos feito tudo mal e às pressas.
Assim, temos sido muito bons a esconder o imenso «lixo» da nossa conturbada sociedade debaixo do tapete da guerra e detrás das portas da Paz. Dos velhos e empoeirados problemas do povo só temos passado o pano do pó nos problemas absolutamente visíveis. Só nos empenhamos em passar o pano do chão nas superfícies onde circulam os estrangeiros…
terça-feira, 31 de agosto de 2010
Alguém Conhece Um Edifício Construído nos Anos 80 Pelo Ministério da Construção e Habitação?
O pessoal da minha geração vive, absolutamente, maravilhado com a nova faceta de Angola. Edifícios belos e moderníssimos. Estradas asfaltadas. Passeios novos. Ruas limpas e iluminadas. Jardins fantásticos com fontes luminosas.
Para essa geração que cresceu nas privações da guerra e do socialismo, essa nova e deslumbrante faceta de Angola é a prova categórica do enorme esforço do «Governo» e da grande capacidade dos nossos governantes.
Isto fez-me lembrar a primeira vez que saí de Angola para Portugal. Era a última semana do mês de Outubro de 1991. Tínhamos acabado de sair do penoso socialismo e estávamos sob os inebriantes efeitos do processo de paz e reconciliação saído dos acordos de Bicesse. Naquela altura, Portugal era um mundo novo para mim. Rendi-me, rapidamente, às fantásticas paisagens urbanas e às inúmeras ofertas do consumismo capitalista. Todos os bens de consumo que, nos duros anos do socialismo, achávamos inalcançáveis estavam ali expostos em grandes quantidades.
Queria partilhar as maravilhas que passei a ver todos os dias e impressionar o pessoal que ficou em Angola. Por isso, comprei uma máquina fotográfica Kodak e comecei a fotografar montras das lojas, hipermercados, ruas, jardins, edifícios, etc. Reuni um bom número de álbuns e entreguei-os a um portador que regressava a Angola.
Absolutamente convencido dos estragos que aquelas fotos iriam causar, esperei pela resposta dos meus familiares e amigos. Passado algum tempo, comecei a receber as tão esperadas cartas. Os meus irmãos, primos e amigos ficaram, naturalmente, maravilhados. Mas a minha mãe e os meus tios não!
Para minha grande surpresa, eles não acharam nenhuma novidade nos temas das fotografias que receberam. Antes pelo contrário: as suas cartas transmitiam uma dolorosa nostalgia da Angola do tempo deles. Minha mãe: «Filho, as montras que fotografaste fizeram-me lembrar as lojas de Nova Lisboa. Fizeram-me reviver os bons tempos em que andávamos de loja em loja a fazer compras». Minha tia: «Zezinho, a mana mostrou-me as fotos que mandaste. As fotos das ruas iluminadas e enfeitadas para o Natal fizeram-me lembrar as ruas do Huambo do nosso tempo. Eu adorava admirar aquele maravilhoso colorido nocturno. Ai que saudades!». Meu tio que já era um importante quadro da administração pública: «Zezinho, já vi as fotos que mandaste. Gostei, sobretudo, das fotos do Hipermercado de Braga. Fez-me lembrar o Pão de açúcar de Luanda. Aquilo era fantástico». Outro meu tio: «Zé, eu vi as fotos que mandaste para a mana. Fiquei com uma das fotos do magnífico jardim com a fonte luminosa. É para matar as saudades do tempo da nossa mocidade quando íamos com as namoradas aos jardins e tirávamos fotografias nas fontes luminosas do Huambo e do Lubango».
Fiquei chocado! Afinal, tudo o que, em 1991/92, eu estava a admirar em Portugal já havia em Angola?! Nos princípios dos anos 70 Luanda já tinha um grande hipermercado?! O Huambo já tinha lojas iguais as que admirei em Lisboa, Porto e Braga?! As cidades de Angola já eram limpas e organizadas, já tinham magníficos jardins e belas fontes luminosas e já eram tão bem iluminadas como as cidades de Portugal?!
Custou-me acreditar. Por mais que tentasse, não conseguia imaginar uma Angola como a que a minha mãe e os meus tios descreveram! Porque cresci a ver lojas com montras vazias e gradeadas. Acostumei-me a viver em cidades sujas, desorganizadas e constantemente sem luz. Habituei-me a conviver com ruas esburacadas, prédios degradados, jardins maltratados e fontes destruídas e a sem água.
Parti, então, em busca desta Angola maravilhosa que os nossos mais velhos conheceram. Devorei os livros com imagens da Angola dos meus kotas. E a internet dizimou todas as minhas dúvidas: As cidades e vilas de Angola eram modernas e magníficas.
O pessoal da minha geração pode conhecer Angola do tempo dos nossos pais e tios clicando neste link: http://www.sanzalangola.com/galeria/cidades.
Este regresso a Angola dos nossos kotas deixou-me indignado. É que passamos toda a nossa infância e adolescência a ouvir falar do mega projecto de Reconstrução Nacional. Os dirigentes socialistas diziam estar a reconstruir uma Angola que os colonialistas não souberam erguer. Tínhamos o Ministério da Construção e Habitação. Sempre tivemos Ministros, Vice-Ministros, Delegados Provinciais e vários funcionários que todos os dias iam trabalhar para os seus gabinetes e postos de serviço. Importamos imensa maquinaria pesada ligada ao sector da construção e engenharia civis. Enfim, o Estado gastou imenso dinheiro a sustentar o dito projecto de Reconstrução Nacional.
Mas, afinal, fomos sempre mantidos no obscurantismo e a tão falada Reconstrução Nacional não passou de um vistoso aparato da propaganda ao serviço de um grupo de incompetentes astutamente mascarados de socialistas. Porque eu não me lembro de ver um único edifício erguido pelo Ministério da Construção e Habitação. Não me lembro de ver qualquer obra concebida e projectada pelos técnicos do Ministério. Pode ser que esteja a ser injusto. Mas nas cidades onde vivi (Huambo e Lubango) não me lembro de ter visto uma obra nova. No Lubango, em finais dos anos 80, vi os soviéticos a acabarem de construir um desses prédios que os colonos deixaram. Vi os Jugoslavos a asfaltarem algumas ruas da cidade. Só isso e nada mais!
Os dirigentes socialistas não acrescentaram em nada ao património urbanístico e cultural da cidade do Lubango que nunca esteve em Guerra. Não edificaram casas, não fizeram nem conservaram as ruas e sempre ignoraram a importância urbana de um simples jardim ou de uma rua bem iluminada.
Para essa geração que cresceu nas privações da guerra e do socialismo, essa nova e deslumbrante faceta de Angola é a prova categórica do enorme esforço do «Governo» e da grande capacidade dos nossos governantes.
Isto fez-me lembrar a primeira vez que saí de Angola para Portugal. Era a última semana do mês de Outubro de 1991. Tínhamos acabado de sair do penoso socialismo e estávamos sob os inebriantes efeitos do processo de paz e reconciliação saído dos acordos de Bicesse. Naquela altura, Portugal era um mundo novo para mim. Rendi-me, rapidamente, às fantásticas paisagens urbanas e às inúmeras ofertas do consumismo capitalista. Todos os bens de consumo que, nos duros anos do socialismo, achávamos inalcançáveis estavam ali expostos em grandes quantidades.
Queria partilhar as maravilhas que passei a ver todos os dias e impressionar o pessoal que ficou em Angola. Por isso, comprei uma máquina fotográfica Kodak e comecei a fotografar montras das lojas, hipermercados, ruas, jardins, edifícios, etc. Reuni um bom número de álbuns e entreguei-os a um portador que regressava a Angola.
Absolutamente convencido dos estragos que aquelas fotos iriam causar, esperei pela resposta dos meus familiares e amigos. Passado algum tempo, comecei a receber as tão esperadas cartas. Os meus irmãos, primos e amigos ficaram, naturalmente, maravilhados. Mas a minha mãe e os meus tios não!
Para minha grande surpresa, eles não acharam nenhuma novidade nos temas das fotografias que receberam. Antes pelo contrário: as suas cartas transmitiam uma dolorosa nostalgia da Angola do tempo deles. Minha mãe: «Filho, as montras que fotografaste fizeram-me lembrar as lojas de Nova Lisboa. Fizeram-me reviver os bons tempos em que andávamos de loja em loja a fazer compras». Minha tia: «Zezinho, a mana mostrou-me as fotos que mandaste. As fotos das ruas iluminadas e enfeitadas para o Natal fizeram-me lembrar as ruas do Huambo do nosso tempo. Eu adorava admirar aquele maravilhoso colorido nocturno. Ai que saudades!». Meu tio que já era um importante quadro da administração pública: «Zezinho, já vi as fotos que mandaste. Gostei, sobretudo, das fotos do Hipermercado de Braga. Fez-me lembrar o Pão de açúcar de Luanda. Aquilo era fantástico». Outro meu tio: «Zé, eu vi as fotos que mandaste para a mana. Fiquei com uma das fotos do magnífico jardim com a fonte luminosa. É para matar as saudades do tempo da nossa mocidade quando íamos com as namoradas aos jardins e tirávamos fotografias nas fontes luminosas do Huambo e do Lubango».
Fiquei chocado! Afinal, tudo o que, em 1991/92, eu estava a admirar em Portugal já havia em Angola?! Nos princípios dos anos 70 Luanda já tinha um grande hipermercado?! O Huambo já tinha lojas iguais as que admirei em Lisboa, Porto e Braga?! As cidades de Angola já eram limpas e organizadas, já tinham magníficos jardins e belas fontes luminosas e já eram tão bem iluminadas como as cidades de Portugal?!
Custou-me acreditar. Por mais que tentasse, não conseguia imaginar uma Angola como a que a minha mãe e os meus tios descreveram! Porque cresci a ver lojas com montras vazias e gradeadas. Acostumei-me a viver em cidades sujas, desorganizadas e constantemente sem luz. Habituei-me a conviver com ruas esburacadas, prédios degradados, jardins maltratados e fontes destruídas e a sem água.
Parti, então, em busca desta Angola maravilhosa que os nossos mais velhos conheceram. Devorei os livros com imagens da Angola dos meus kotas. E a internet dizimou todas as minhas dúvidas: As cidades e vilas de Angola eram modernas e magníficas.
O pessoal da minha geração pode conhecer Angola do tempo dos nossos pais e tios clicando neste link: http://www.sanzalangola.com/galeria/cidades.
Este regresso a Angola dos nossos kotas deixou-me indignado. É que passamos toda a nossa infância e adolescência a ouvir falar do mega projecto de Reconstrução Nacional. Os dirigentes socialistas diziam estar a reconstruir uma Angola que os colonialistas não souberam erguer. Tínhamos o Ministério da Construção e Habitação. Sempre tivemos Ministros, Vice-Ministros, Delegados Provinciais e vários funcionários que todos os dias iam trabalhar para os seus gabinetes e postos de serviço. Importamos imensa maquinaria pesada ligada ao sector da construção e engenharia civis. Enfim, o Estado gastou imenso dinheiro a sustentar o dito projecto de Reconstrução Nacional.
Mas, afinal, fomos sempre mantidos no obscurantismo e a tão falada Reconstrução Nacional não passou de um vistoso aparato da propaganda ao serviço de um grupo de incompetentes astutamente mascarados de socialistas. Porque eu não me lembro de ver um único edifício erguido pelo Ministério da Construção e Habitação. Não me lembro de ver qualquer obra concebida e projectada pelos técnicos do Ministério. Pode ser que esteja a ser injusto. Mas nas cidades onde vivi (Huambo e Lubango) não me lembro de ter visto uma obra nova. No Lubango, em finais dos anos 80, vi os soviéticos a acabarem de construir um desses prédios que os colonos deixaram. Vi os Jugoslavos a asfaltarem algumas ruas da cidade. Só isso e nada mais!
Os dirigentes socialistas não acrescentaram em nada ao património urbanístico e cultural da cidade do Lubango que nunca esteve em Guerra. Não edificaram casas, não fizeram nem conservaram as ruas e sempre ignoraram a importância urbana de um simples jardim ou de uma rua bem iluminada.
Vejamos, por exemplo, o estado deplorável desta rua do Lubango (antiga cidade de Sá da bandeira) fotografada por Nelson Viegas no dia 18 de Fevereiro de... 2007.
Antes da independência esta rua chama-se Capelo Ivens. Depois passou a chamar-se Deolinda Rodrigues. Esta rua está uma vergonha! Lubango foi uma cidade que nunca esteve na rota dos grandes palcos da maldita guerra. O que andaram a fazer os Comissários e Governadores Provinciais nos últimos 30 anos?
Esta fotografia é o fiel retrato do vergonhoso estado da bela Angola que herdamos dos «colonialistas portugueses» e que não soubemos conservar e melhorar. E a nova Angola que está a maravilhar o pessoal da minha geração não é nossa. É uma Angola projectada e construída pelos estrangeiros e que, de certeza, não conseguiremos conservar….
segunda-feira, 16 de agosto de 2010
Estamos a Contribuir Para a Reconstrução do Colonialismo
Nasci em 1972. A proclamação da Independência de Angola apanhou-me na inocência dos meus 3 anos. Portanto, não vivi o colonialismo nem tenho a exacta noção de como era Angola portuguesa. Comecei a escola primária na mesma semana da morte de Agostinho Neto. Estávamos em plena época de politização das massas populares, da eliminação de todas as sequelas do colonialismo, da formação do homem novo e do rumo ao socialismo científico. Por isso, passei grande parte da minha infância em comícios e em sessões de politização e esclarecimento.
Lembro-me que o tema preferido dos politizadores da época era denegrir o sistema colonial português. Para eles, todos os problemas da Angola Independente existiam por exclusiva culpa dos colonialistas. Assim, em toda a minha caminhada escolar ensinaram-me a odiar os colonialistas portugueses e o seu sistema de exploração, de humilhação e de exclusão dos filhos de Angola.
Mas naquele tempo éramos pioneiros da OPA. Éramos crianças e pensávamos como crianças. Por isso, acreditávamos piamente na diabolização do colonialismo português e na capacidade dos angolanos construírem uma Angola unida, justa e muito próspera.
Agora que somos adultos está claro para nós que passamos a nossa infância a ser enganados pela propaganda do regime dominante. Porque o sistema colonial continua vivo e eficaz. Os colonialistas nunca chegaram a abandonar Angola. Estão apenas mais escuros dos que outros.
Porque os «libertadores» que combateram arduamente o colonialismo português, odiavam o imperialismo com todas as suas forças e estavam na primeira linha do obcecado combate contra «o neocolonialismo», tornaram-se, rapidamente, nos novos «colonos» da Angola «independente» e tiveram o descaramento de manter incólumes e inalteráveis os vícios sociais bem como o quadro discriminatório, opressivo e explorador do sistema colonial português.
Portanto, nunca houve, entre nós, um verdadeiro processo de descolonização das mentalidades, das consciências, dos hábitos sociais, das estruturas políticas, administrativas e económicas. Nunca fomos capazes de erguer, com a preciosa ajuda dos estrangeiros de boa vontade, uma Angola de angolanos, com angolanos e para os angolanos.
E mesmo nesta fase propícia que o nosso país atravessa, não temos feito algo de extraordinário pelos nossos e pela terra que muito amamos. Estamos todos a desperdiçar energias, talentos e conhecimentos na reconstrução e rejuvenescimento do velho sistema que sempre marginalizou, desvalorizou e prejudicou os filhos de Angola.
E custa-nos contemplar esta reconstrução maciça do colonialismo que aprendemos a odiar e a combater. É que tanta energia foi dispendida para expulsar da «nossa terra» os «exploradores colonialistas». Tantos filhos de Angola foram torturados, mutilados e barbaramente ceifados em nome de uma suposta luta contra o «neocolonialismo», contra a «neocolonização russo-cubana» e em nome de um pretenso combate para impedir que o «nosso» país fosse dominado pelo «imperialismo internacional e seus lacaios». Depois do 25 de Abril de 1974 inúmeros brancos nascidos ou radicados em Angola foram «saneados» em nome de uma suposta «africanização dos quadros». Gerou-se tanta polémica em torno do destino jurídico dos «colonos». Falou-se bastante da questão da nacionalidade angolana dos brancos.
Mas, quase 35 anos depois da nossa pretensa «independência» dolorosamente constatamos que continuamos a sobreviver numa terra dominada por uma poderosíssima minoria estrangeira e que afinal tudo não passou de um patriotismo mal envernizado e de uma gritante hipocrisia de alguns ambiciosos astutamente mascarados de nacionalistas.
Assim, como não houve descolonização, continuamos a ser dominados por um profundo complexo de inferioridade que nos leva a endeusar o estrangeiro e a uma sobrevalorizar tudo o que vem do exterior.
Como não houve descolonização, continuamos a sobrevalorizar tudo o que é produzido e consumido no estrangeiro. Por isso, preferimos esbanjar o nosso dinheiro no Estrangeiro. Só que esse nosso comportamento de gente complexada está a atrasar Angola. Esta nossa vaidade está desvalorizar e a prejudicar os angolanos. Porque com o imenso dinheiro que esbanjamos na África do Sul, Namíbia, Brasil, Dubai e nos principais países da Europa estamos a fortalecer as economias e a enriquecer os habitantes desses países. Assim, cada vez que vamos a Lisboa esbanjar dinheiro nas lojas do Rossio ou do Colombo estamos na verdade a fortalecer a economia portuguesa e a enriquecer os comerciantes de Lisboa. Enfim, estamos a contribuir financeiramente para que o estado português continue a ter muitas receitas que irão contribuir para que os seus cidadãos possam ter boa vida; viver mais tempo; aumentar os seus conhecimentos.
Como não houve descolonização, os nossos dirigentes e os nossos ricos continuam indiferentes ao desumano estado da saúde nacional e persistem no sustento de uma rede privada de cuidados de saúde. Por isso, preferem arrancar o dente na África do Sul, fazer análises no Brasil e frequentarem as clínicas de Portugal, Espanha e Inglaterra para serem bem cuidados e aumentarem mais uns anos de vida.
É que com essas atitudes estão a contribuir para o atraso do País e para a perpetuação do sistema colonial. Porque não estão a acreditar nas capacidades dos angolanos. Estão a passar um enorme e bem vistoso atestado de incompetência aos seus compatriotas que estudaram enfermagem e medicina. Estão a dizer ao mundo que os angolanos não sabem governar-se e não têm capacidade de criar condições para que possam ser tratados com humanismo e dignidade em Angola, em Hospitais angolanos e por médicos angolanos. Estão a negar aos compatriotas que não têm possibilidades de irem tratar-se nas clínicas do estrangeiro o direito de receberem a assistência médica e medicamentosa que merecem para poderem usufruir de uma vida longa e saudável.
O pior de tudo é que o imenso dinheiro que os angolanos deixam nas clínicas privadas da Namíbia, África do Sul, Brasil, Portugal, França Espanha e Inglaterra estão a enriquecer os gestores, os administradores, os médicos, os enfermeiros e outro pessoal dessas clínicas. O imenso dinheiro de Angola está a fortalecer a economia e o sistema de saúde desses países. Enfim, os angolanos estão a contribuir financeiramente para que os dirigentes desses países continuem a proporcionar aos seus cidadãos uma vida longa, feliz e saudável.
Lembro-me que o tema preferido dos politizadores da época era denegrir o sistema colonial português. Para eles, todos os problemas da Angola Independente existiam por exclusiva culpa dos colonialistas. Assim, em toda a minha caminhada escolar ensinaram-me a odiar os colonialistas portugueses e o seu sistema de exploração, de humilhação e de exclusão dos filhos de Angola.
Mas naquele tempo éramos pioneiros da OPA. Éramos crianças e pensávamos como crianças. Por isso, acreditávamos piamente na diabolização do colonialismo português e na capacidade dos angolanos construírem uma Angola unida, justa e muito próspera.
Agora que somos adultos está claro para nós que passamos a nossa infância a ser enganados pela propaganda do regime dominante. Porque o sistema colonial continua vivo e eficaz. Os colonialistas nunca chegaram a abandonar Angola. Estão apenas mais escuros dos que outros.
Porque os «libertadores» que combateram arduamente o colonialismo português, odiavam o imperialismo com todas as suas forças e estavam na primeira linha do obcecado combate contra «o neocolonialismo», tornaram-se, rapidamente, nos novos «colonos» da Angola «independente» e tiveram o descaramento de manter incólumes e inalteráveis os vícios sociais bem como o quadro discriminatório, opressivo e explorador do sistema colonial português.
Portanto, nunca houve, entre nós, um verdadeiro processo de descolonização das mentalidades, das consciências, dos hábitos sociais, das estruturas políticas, administrativas e económicas. Nunca fomos capazes de erguer, com a preciosa ajuda dos estrangeiros de boa vontade, uma Angola de angolanos, com angolanos e para os angolanos.
E mesmo nesta fase propícia que o nosso país atravessa, não temos feito algo de extraordinário pelos nossos e pela terra que muito amamos. Estamos todos a desperdiçar energias, talentos e conhecimentos na reconstrução e rejuvenescimento do velho sistema que sempre marginalizou, desvalorizou e prejudicou os filhos de Angola.
E custa-nos contemplar esta reconstrução maciça do colonialismo que aprendemos a odiar e a combater. É que tanta energia foi dispendida para expulsar da «nossa terra» os «exploradores colonialistas». Tantos filhos de Angola foram torturados, mutilados e barbaramente ceifados em nome de uma suposta luta contra o «neocolonialismo», contra a «neocolonização russo-cubana» e em nome de um pretenso combate para impedir que o «nosso» país fosse dominado pelo «imperialismo internacional e seus lacaios». Depois do 25 de Abril de 1974 inúmeros brancos nascidos ou radicados em Angola foram «saneados» em nome de uma suposta «africanização dos quadros». Gerou-se tanta polémica em torno do destino jurídico dos «colonos». Falou-se bastante da questão da nacionalidade angolana dos brancos.
Mas, quase 35 anos depois da nossa pretensa «independência» dolorosamente constatamos que continuamos a sobreviver numa terra dominada por uma poderosíssima minoria estrangeira e que afinal tudo não passou de um patriotismo mal envernizado e de uma gritante hipocrisia de alguns ambiciosos astutamente mascarados de nacionalistas.
Assim, como não houve descolonização, continuamos a ser dominados por um profundo complexo de inferioridade que nos leva a endeusar o estrangeiro e a uma sobrevalorizar tudo o que vem do exterior.
Como não houve descolonização, continuamos a sobrevalorizar tudo o que é produzido e consumido no estrangeiro. Por isso, preferimos esbanjar o nosso dinheiro no Estrangeiro. Só que esse nosso comportamento de gente complexada está a atrasar Angola. Esta nossa vaidade está desvalorizar e a prejudicar os angolanos. Porque com o imenso dinheiro que esbanjamos na África do Sul, Namíbia, Brasil, Dubai e nos principais países da Europa estamos a fortalecer as economias e a enriquecer os habitantes desses países. Assim, cada vez que vamos a Lisboa esbanjar dinheiro nas lojas do Rossio ou do Colombo estamos na verdade a fortalecer a economia portuguesa e a enriquecer os comerciantes de Lisboa. Enfim, estamos a contribuir financeiramente para que o estado português continue a ter muitas receitas que irão contribuir para que os seus cidadãos possam ter boa vida; viver mais tempo; aumentar os seus conhecimentos.
Como não houve descolonização, os nossos dirigentes e os nossos ricos continuam indiferentes ao desumano estado da saúde nacional e persistem no sustento de uma rede privada de cuidados de saúde. Por isso, preferem arrancar o dente na África do Sul, fazer análises no Brasil e frequentarem as clínicas de Portugal, Espanha e Inglaterra para serem bem cuidados e aumentarem mais uns anos de vida.
É que com essas atitudes estão a contribuir para o atraso do País e para a perpetuação do sistema colonial. Porque não estão a acreditar nas capacidades dos angolanos. Estão a passar um enorme e bem vistoso atestado de incompetência aos seus compatriotas que estudaram enfermagem e medicina. Estão a dizer ao mundo que os angolanos não sabem governar-se e não têm capacidade de criar condições para que possam ser tratados com humanismo e dignidade em Angola, em Hospitais angolanos e por médicos angolanos. Estão a negar aos compatriotas que não têm possibilidades de irem tratar-se nas clínicas do estrangeiro o direito de receberem a assistência médica e medicamentosa que merecem para poderem usufruir de uma vida longa e saudável.
O pior de tudo é que o imenso dinheiro que os angolanos deixam nas clínicas privadas da Namíbia, África do Sul, Brasil, Portugal, França Espanha e Inglaterra estão a enriquecer os gestores, os administradores, os médicos, os enfermeiros e outro pessoal dessas clínicas. O imenso dinheiro de Angola está a fortalecer a economia e o sistema de saúde desses países. Enfim, os angolanos estão a contribuir financeiramente para que os dirigentes desses países continuem a proporcionar aos seus cidadãos uma vida longa, feliz e saudável.
José Maria Huambo
segunda-feira, 2 de agosto de 2010
CHEIOS DE NADA!
Martin Luther King sentenciou um dia que nada no mundo era mais perigoso que a ignorância sincera e a estupidez consciente. Infelizmente, alguns quadros da minha geração que são altos funcionários do Estado e das grandes empresas públicas e privadas estão cada vez mais a exibir publicamente esses dois vícios duramente censurados por Luther King.
É que os citados quadros vivem absolutamente convencidos de que só eles é que estão a fazer algo realmente importante para o tão desejado desenvolvimento de Angola. Os outros que não têm a sorte de usufruírem dos cargos, privilégios e ordenados iguais aos seus não passam de uns frustrados da vida que só falam, escrevem, criticam e nada fazem de concreto pelo País.
Para estes jovens e promissores quadros, Angola está definitivamente bem. O país cresceu mais rápido do que os outros alguma vez cresceram e não há nenhum problema dos angolanos que o nosso esforçadíssimo governo não esteja a resolver de forma segura e clarividente. Por isso, julgam que questionar, hoje, o rumo do País e insistir nas críticas ao esforçado governo de Eduardo dos Santos não passa de uma velha paranóia de alguns frustrados que apenas escrevem, criticam e berram para chamar atenção e mendigar uns tachos.
Para este grupo de jovens bem sucedidos, o desenvolvimento de Angola é algo fácil, simples e rápido, que só chegou tarde por causa da guerra que nos foi imposta pelo ambicioso líder do Galo Negro. E insistem em dar como certa a absoluta impossibilidade das armas voltarem a devastar as vidas dos angolanos.
Em 1754 o escritor e político inglês Horace Walpole criou e introduziu a palavra serendipidade (serendipity). Serendipidade é todo o acaso feliz e extraordinário que origina descobertas fantásticas.
O mundo está cheio de importantes serendipidades. Por exemplo: Colombo descobriu a América por um acaso. Fleming descobriu a penicilina por ter ido para casa sem fechar a janela do laboratório. Newton descobriu a lei da gravidade depois de ter visto uma maçã a cair ao chão.
O desenvolvimento de Angola não é uma serendipidade. Não é um acaso feliz e extraordinário surgido espontaneamente por força mágica da actual conjuntura da Paz e dos nossos tão falados recursos naturais. Há regras, atitudes e valores que devem ser, religiosamente, cumpridos pelos povos que desejam fazer a laboriosa caminhada do desenvolvimento.
Por isso, Angola não vai caminhar magicamente para o desenvolvimento apenas por força dos maquilhados discursos e da renovada imagem dos velhos responsáveis pela destruição e estagnação do País.
Angola não vai caminhar magicamente para o desenvolvimento apenas por causa dos elogios hipócritas e oportunistas de alguns políticos e empresários estrangeiros que detestam África e que apenas olham para Angola como uma terra de extraordinárias oportunidades de negócios.
Com a preciosa ajuda dos estrangeiros de boa vontade que tencionam viver, conviver e partilhar connosco as alegrias e tristezas das nossas vidas, o desenvolvimento de Angola terá de ser um projecto de angolanos, com angolanos e para angolanos.
Há um extracto de um discurso do ilustre estadista português Francisco Sá Carneiro (1934-1980) que eu gosto imenso:
«O homem é a nossa medida, nossa regra absoluta, nosso início e a nossa vida. Sem o absoluto respeito por ele não há nem pode haver democracia verdadeira»
Assim, o desenvolvimento terá de ser um frutuoso resultado um investimento sério, maciço e disciplinado nas pessoas, no capital humano de Angola. Porque é um facto longamente estudado, provado e comprovado que só prosperam os países que investem no seu povo e apostam no conhecimento cultural, científico e tecnológico dos seus cidadãos.
Por isso, não há nem pode haver desenvolvimento verdadeiro sem o absoluto respeito pelos angolanos. Por absoluto respeito entende-se que o bem-estar físico e espiritual do angolano tem de ser a única e exclusiva razão de todas as decisões políticas. O angolano deve ser cuidado, acarinhado, valorizado e protegido em todas as etapas da sua vida.
Nós os frustrados do costumes não andamos a «berrar» sem razão aparente. Estamos apenas a chamar atenção das pessoas responsáveis pelo nosso destino colectivo para as consequências negativas de um modelo de desenvolvimento que exclui, humilha, oprime e desvaloriza os angolanos.
Na verdade, os angolanos não precisam de ler ou ouvir os nossos desabafos públicos para terem plena consciência dos sérios problemas do país. Todos estão perfeitamente cientes dos enormes obstáculos que enfrentam nesta longa luta para saírem da miséria e usufruírem dos abundantes lucros das riquezas do País. O Povo sabe muito bem que vive numa sociedade cada vez mais injusta onde a pobreza absoluta da maioria convive lado a lado com a riqueza ostensiva de alguns.
Nós os frustrados do costume estamos, apenas, a abordar os crónicos problemas e a buscar soluções de forma sensata, académica e inteligente. O verdadeiro perigo reside no facto de as pessoas não terem muita pachorra para abordarem de forma académica, sensata e inteligente os crónicos problemas que as afectam e prejudicam. Por isso, preferem recorrer ao meio mais fácil: usar a violência e provocar tumultos para exteriorizarem as suas frustrações não ouvidas nem levadas à sério. É como disse Martin Luther King: «as rebeliões e os tumultos são a linguagem daqueles que ninguém entende».
Depois, e vendo bem as coisas, esses jovens quadros que se julgam os únicos a fazer algo realmente importante para o tão desejado desenvolvimento de Angola, na verdade, não estão a fazer nada de novo e extraordinário. Estão apenas a desperdiçar os seus talentos e conhecimentos na consolidação e rejuvenescimento de um velho estilo de governância que sempre marginalizou, desvalorizou e prejudicou os filhos de Angola.
É que os citados quadros vivem absolutamente convencidos de que só eles é que estão a fazer algo realmente importante para o tão desejado desenvolvimento de Angola. Os outros que não têm a sorte de usufruírem dos cargos, privilégios e ordenados iguais aos seus não passam de uns frustrados da vida que só falam, escrevem, criticam e nada fazem de concreto pelo País.
Para estes jovens e promissores quadros, Angola está definitivamente bem. O país cresceu mais rápido do que os outros alguma vez cresceram e não há nenhum problema dos angolanos que o nosso esforçadíssimo governo não esteja a resolver de forma segura e clarividente. Por isso, julgam que questionar, hoje, o rumo do País e insistir nas críticas ao esforçado governo de Eduardo dos Santos não passa de uma velha paranóia de alguns frustrados que apenas escrevem, criticam e berram para chamar atenção e mendigar uns tachos.
Para este grupo de jovens bem sucedidos, o desenvolvimento de Angola é algo fácil, simples e rápido, que só chegou tarde por causa da guerra que nos foi imposta pelo ambicioso líder do Galo Negro. E insistem em dar como certa a absoluta impossibilidade das armas voltarem a devastar as vidas dos angolanos.
Em 1754 o escritor e político inglês Horace Walpole criou e introduziu a palavra serendipidade (serendipity). Serendipidade é todo o acaso feliz e extraordinário que origina descobertas fantásticas.
O mundo está cheio de importantes serendipidades. Por exemplo: Colombo descobriu a América por um acaso. Fleming descobriu a penicilina por ter ido para casa sem fechar a janela do laboratório. Newton descobriu a lei da gravidade depois de ter visto uma maçã a cair ao chão.
O desenvolvimento de Angola não é uma serendipidade. Não é um acaso feliz e extraordinário surgido espontaneamente por força mágica da actual conjuntura da Paz e dos nossos tão falados recursos naturais. Há regras, atitudes e valores que devem ser, religiosamente, cumpridos pelos povos que desejam fazer a laboriosa caminhada do desenvolvimento.
Por isso, Angola não vai caminhar magicamente para o desenvolvimento apenas por força dos maquilhados discursos e da renovada imagem dos velhos responsáveis pela destruição e estagnação do País.
Angola não vai caminhar magicamente para o desenvolvimento apenas por causa dos elogios hipócritas e oportunistas de alguns políticos e empresários estrangeiros que detestam África e que apenas olham para Angola como uma terra de extraordinárias oportunidades de negócios.
Com a preciosa ajuda dos estrangeiros de boa vontade que tencionam viver, conviver e partilhar connosco as alegrias e tristezas das nossas vidas, o desenvolvimento de Angola terá de ser um projecto de angolanos, com angolanos e para angolanos.
Há um extracto de um discurso do ilustre estadista português Francisco Sá Carneiro (1934-1980) que eu gosto imenso:
«O homem é a nossa medida, nossa regra absoluta, nosso início e a nossa vida. Sem o absoluto respeito por ele não há nem pode haver democracia verdadeira»
Assim, o desenvolvimento terá de ser um frutuoso resultado um investimento sério, maciço e disciplinado nas pessoas, no capital humano de Angola. Porque é um facto longamente estudado, provado e comprovado que só prosperam os países que investem no seu povo e apostam no conhecimento cultural, científico e tecnológico dos seus cidadãos.
Por isso, não há nem pode haver desenvolvimento verdadeiro sem o absoluto respeito pelos angolanos. Por absoluto respeito entende-se que o bem-estar físico e espiritual do angolano tem de ser a única e exclusiva razão de todas as decisões políticas. O angolano deve ser cuidado, acarinhado, valorizado e protegido em todas as etapas da sua vida.
Nós os frustrados do costumes não andamos a «berrar» sem razão aparente. Estamos apenas a chamar atenção das pessoas responsáveis pelo nosso destino colectivo para as consequências negativas de um modelo de desenvolvimento que exclui, humilha, oprime e desvaloriza os angolanos.
Na verdade, os angolanos não precisam de ler ou ouvir os nossos desabafos públicos para terem plena consciência dos sérios problemas do país. Todos estão perfeitamente cientes dos enormes obstáculos que enfrentam nesta longa luta para saírem da miséria e usufruírem dos abundantes lucros das riquezas do País. O Povo sabe muito bem que vive numa sociedade cada vez mais injusta onde a pobreza absoluta da maioria convive lado a lado com a riqueza ostensiva de alguns.
Nós os frustrados do costume estamos, apenas, a abordar os crónicos problemas e a buscar soluções de forma sensata, académica e inteligente. O verdadeiro perigo reside no facto de as pessoas não terem muita pachorra para abordarem de forma académica, sensata e inteligente os crónicos problemas que as afectam e prejudicam. Por isso, preferem recorrer ao meio mais fácil: usar a violência e provocar tumultos para exteriorizarem as suas frustrações não ouvidas nem levadas à sério. É como disse Martin Luther King: «as rebeliões e os tumultos são a linguagem daqueles que ninguém entende».
Depois, e vendo bem as coisas, esses jovens quadros que se julgam os únicos a fazer algo realmente importante para o tão desejado desenvolvimento de Angola, na verdade, não estão a fazer nada de novo e extraordinário. Estão apenas a desperdiçar os seus talentos e conhecimentos na consolidação e rejuvenescimento de um velho estilo de governância que sempre marginalizou, desvalorizou e prejudicou os filhos de Angola.
José Maria Huambo
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