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segunda-feira, 24 de abril de 2006

A consolidação da Paz, segundo João Paulo II

Na primeira semana deste mês ocorreram duas marcantes efemérides que inspiraram a reflexão de hoje: o 4º aniversário dos «acordos de Paz» e o 1º aniversário da morte do Papa João Paulo II, um dos mais notáveis mensageiros da Paz. Decidi recorrer às sábias mensagens de Paz desse grande Líder por estar cada vez mais convicto da fragilidade da nossa Paz. E muito além dos efusivos festejos e dos habituais discursos que proclamam estarmos definitivamente pacificados, urge repensarmos e questionarmos a forma como tem sido posta em prática a tão propalada «consolidação da Paz». Porque contrariamente ao que se desejava, vejo que insistimos em consolidar a Paz sob os alicerces da velha estrutura onde ainda imperam o abuso de poder, a cultura do medo, a dominação de uns pelos outros, a férrea imposição de ideias, as medidas arbitrárias, o absoluto desrespeito pelos cidadãos, as situações de miséria, a degradação dos valores, etc. Assim, a Paz que apregoamos estar consolidada não tem passado de uma trégua precária, de um equilíbrio instável e tem sido assegurada por uma tranquilidade puramente exterior e imposta pelo terror das represálias. É hora, então, de passar a palavra ao Papa João Paulo II:

Que tenha definitivamente terminado para ti, querida Angola, o tempo do teu desamparo! Queridos angolanos! Congratulo-me convosco pela estrada que corajosamente iniciastes. Refiro-me a consolidação de Angola como um Estado de direito, assente nos valores e nos princípios da vida, da justiça social e do respeito mútuo (visita a Angola 1992). Mas Ninguém se iluda de que a simples ausência de guerra, apesar de tão desejada, seja sinónimo de paz duradoura. Não há paz verdadeira, sem equidade, verdade, justiça e solidariedade. Está destinado à falência qualquer projecto que deixe separados dois direitos indivisíveis: o direito à paz e o direito a um progresso integral e solidário. As injustiças, as excessivas desigualdades de ordem económica ou social, a inveja, a desconfiança e o orgulho que grassam entre os homens, são uma constante ameaça à paz e provocam as guerras. Tudo o que se faz para combater estas desordens, contribui para edificar a paz e evitar a guerra (mens. de Paz de 2000). Assim, para restaurar a Paz há que repor a justiça da verdade, a justiça da igualdade social, a justiça da solidariedade fraterna (visita a Angola, 1992).

Para servir a Paz é preciso respeitar a liberdade. Nunca haverá verdadeira liberdade, fundamento da paz, quando todos os poderes estiverem concentrados nas mãos duma só classe social, ou duma só raça, ou dum só grupo, ou quando o bem comum for confundido com os interesses dum só partido que se identifique com o Estado. E não haverá verdadeira liberdade quando as liberdades dos indivíduos se acharem absorvidas por uma colectividade. A liberdade constitui a medida da maturidade do homem e da nação (mensagem de Paz de 1981).

Se quereis a Paz, respeitai a liberdade de consciência de cada homem. Nenhuma autoridade humana tem o direito de intervir na consciência seja de quem for. Isto implica, por sua vez, que todos devem respeitar a consciência de cada um e não procurar impor a ninguém a própria «verdade», permanecendo íntegro o direito de a professar, sem que, por isso, seja desprezado quem pensa de outro modo. Em suma, é ao nível da consciência que se pode encontrar a mais eficaz solução do problema de assegurar uma paz sólida e duradoura. Uma séria ameaça à paz se encontra na intolerância, que se manifesta na recusa da liberdade de consciência dos outros. Das diversas conjunturas da história apreendemos dolorosamente os excessos a que ela pode conduzir. A intolerância pode-se insinuar em todos os aspectos da vida social, manifestando-se na marginalização ou opressão das pessoas e minorias, que procuram seguir a própria consciência no que se refere aos seus modos legítimos de viver. Na vida pública, a intolerância não deixa espaço à pluralidade de opções políticas ou sociais, impondo deste modo a todos uma visão uniforme da organização civil e cultural (mens. de Paz de 1991).

Para fortificar a Paz urge recorrer incansavelmente à verdade, que é por excelência a força pacífica e potente da paz, uma vez que ela se comunica pela sua própria irradiação, extravasando para fora de todos os constrangimentos. Se é exacto afirmar, e ninguém duvida disso, que a verdade serve a causa da paz, também é indiscutível que a «não-verdade» anda a «pari passu» com a causa da violência e da guerra. Por «não-verdade» é preciso entender aqui todas as formas e todos os níveis de ausência, de recusa e de desprezo da verdade: mentira propriamente dita, informação parcial e deformada, propaganda sectária, manipulação dos meios de comunicação e outras ainda, por exemplo, da prática que consiste em impor àqueles que não compartilham as mesmas posições a fim de mais facilmente os atacar e os reduzir ao silêncio a etiqueta de inimigos, atribuindo-lhes intenções hostis e estigmatizando-os como agressores, mediante uma propaganda hábil e constante: eis o desprezo da verdade, posto em acção, a fim de desenvolver um clima de incerteza, no qual se pretende constranger as pessoas, os grupos, as próprias instâncias internacionais a silêncios resignados e cúmplices, a compromissos parciais e a reacções não razoáveis; todas estas atitudes são igualmente susceptíveis de favorecerem o jogo perigoso da violência e de atacarem a causa da paz (mens. de Paz de 1980).

Em nome do afecto que tenho por cada um de vós, peço-vos firmemente que procureis o diálogo (visita a Angola, 1992). Julgo ser útil, pois, recordar aqui as qualidades de um verdadeiro diálogo. Elas têm aplicação em primeiro lugar no diálogo entre pessoas; mas eu penso também e sobretudo no diálogo entre grupos sociais, entre forças políticas numa Nação. E hão de verificar-se também no diálogo entre os vastos agrupamentos humanos que se distinguem e se enfrentam no plano étnico, cultural, ideológico ou religioso. O diálogo exige a abertura para o acolhimento: que cada uma das partes exponha os próprios dados, mas que também ouça a exposição da situação como a outra parte a apresenta e sente sinceramente, com os verdadeiros problemas que lhe são peculiares, os seus direitos, as injustiças de que tem consciência e as soluções razoáveis que propõe. Neste sentido, o diálogo é fazer de outrem um próximo; é aceitar a sua contribuição; é partilhar com ele a responsabilidade perante a verdade e a justiça (mens. de Paz de 1983).

A justiça anda em relação permanente e dinâmica com a paz. Justiça e paz têm em vista o bem de cada um e de todos, pelo que exigem ordem e verdade. Quando uma é ameaçada, vacilam as duas; quando se ofende a justiça, põe-se em perigo também a paz. Justiça e paz não são conceitos abstractos nem ideais inacessíveis; são valores inseridos no coração de cada pessoa, como património comum. Indivíduos, famílias, comunidades, nações, todos são chamados a viver na justiça e a trabalhar pela paz. Ninguém pode eximir-se desta responsabilidade. Posto ao serviço dos cidadãos, o Estado é o gestor dos bens do povo, que deve administrar tendo em vista o bem comum. O bom governo requer o controle pontual e a plena legalidade em todas as transacções económicas e financeiras. Não se pode permitir de maneira alguma que os recursos destinados ao bem público sirvam para outros interesses de carácter privado ou mesmo criminoso. O uso fraudulento do dinheiro público penaliza sobretudo os pobres, que são os primeiros a sofrerem a privação dos serviços básicos indispensáveis para o desenvolvimento da pessoa. Quando, depois, a corrupção se infiltra na administração da justiça, são ainda os pobres quem mais duramente suporta as consequências: atrasos, ineficácia, carências estruturais, falta duma defesa adequada. E tantas vezes não lhes resta outro caminho senão sofrer a prepotência (mens. de Paz de 1998).

Todas as pessoas têm o direito de buscar e de alcançar o que é bom e verdadeiro. Todas têm o direito de escolher aqueles bens que elevam a vida. Aquilo que é verdadeiro quanto ao desenvolvimento das pessoas individuais, mediante uma selecção de valores que elevam a vida, aplica-se também ao desenvolvimento da sociedade. Tudo aquilo que impede a autêntica liberdade vai contra o desenvolvimento da sociedade e das instituições sociais. A exploração, as ameaças, a sujeição forçada, a recusa por parte de um sector da sociedade a dar a outros oportunidades, são coisas inaceitáveis e contradizem a própria noção de solidariedade humana. Recusar os meios para alcançar o pleno desenvolvimento a um sector de determinada sociedade, ou então a uma inteira nação, só poderá levar à insegurança e à agitação social. Isso fomenta o ódio e a divisão e destrói as esperanças de paz (mens. de Paz de 1987).

Como referiu o Papa Paulo VI, «a Paz que põe termo a um conflito é habitualmente uma imposição, um acto de prepotência e um jugo, a que a parte mais fraca e que sucumbe se vê forçada a submeter-se; mas, isso não passa, muitas vezes, de um adiar a desforra que virá mais tarde e de uma aceitação do estatuto protocolar, que serve a disfarçar a hipocrisia de corações que continuam a ser inimigos. Nesta Paz, muito frequentemente fictícia e instável, falta a solução completa do conflito; quer dizer, falta o perdão, falta a renúncia do vencedor às vantagens alcançadas, vantagens que humilham e tornam o vencido inevitavelmente infeliz; por outro lado, falta também ao vencido a força de ânimo para a reconciliação. Paz sem clemência, como se pode chamar Paz ? Paz cheia de espirito de vingança, como pode ela ser verdadeira? De um e de outro lado é necessário o apelar para aquela justiça superior que é o perdão: é este, efectivamente, que reduz a nada as questões insolúveis de prestígio e torna possível outra vez a amizade» (mens. de paz de 1970). Então oferecei o perdão e recebereis a paz. É tempo de nos decidirmos a empreender, juntos e de ânimo firme, uma verdadeira peregrinação de paz, cada qual a partir da situação concreta em que se encontra. As dificuldades são, por vezes, demasiado grandes: a proveniência étnica, a língua, a cultura, a crença religiosa constituem frequentemente uma série de obstáculos. Caminhar juntos, quando sobre os ombros pesam experiências traumatizantes ou mesmo divisões seculares, não é empresa fácil. Surge então a pergunta: Que estrada seguir? Que ponto de orientação tomar? São muitos, certamente, os factores que podem influir favoravelmente no restabelecimento da paz, salvaguardando os imperativos da justiça e da dignidade humana. Mas nenhum processo de paz poderá jamais ter início, se não maturar nos homens uma atitude de sincero perdão. Sem este, as feridas continuam a sangrar, alimentando ao longo de sucessivas gerações um rancor sem fim, que é fonte de vingança e causa de sempre mais ruínas. O perdão oferecido e aceite é a premissa indispensável para caminhar rumo a uma paz autêntica e estável (mens. de Paz de 1997).

O vosso país está a viver momentos cruciais para a recta definição do seu futuro. Que ninguém desanime perante as inevitáveis dificuldades. O Senhor há de ajudar-vos a realizar a reconstrução das consciências e da fraternidade social. Que Deus abençoe o presente e o futuro desta querida Nação (visita a Angola, 1992).

José Maria Huambo

sexta-feira, 21 de abril de 2006

Há quatro Anos!!!

Há quatro anos…Morreu Savimbi em combate, no Leste de Angola. Foi exibida pela Televisão Pública de Angola (TPA) a imagemdo corpo de Jonas Savimbi cravado de balas, moscas e profanado. Para quem tinha dúvidas ou alguma esperança no regresso do líder ou numa reviravolta, tudo ficava claro. Era chegado o fim de uma odisseia começada em1966 no leste de Angola.

Há quatro anos…Nasceu um duplo desafio para o General Paulo Lukamba“Gato”: 1º parar as hostilidades e devolver a paz aos angolanos; 2º salvar a UNITA de um fim inglório e transformá-la num partido político capaz de abraçar a disputa política, sem recorrer a meios militares.

Há quatro anos…O General “Gato” mostrou-se à altura do acontecimentoe das circunstancias. Por um lado, suspendeu as hostilidades e entabulou negociações com as FAA, assinando-se um cessar fogo, que teria na assinatura do memorando de entendimento, em Luanda na casa mãe das leis, o seu ponto alto. Por outro lado, o General“Gato” começou a percorrer o longo e difícil caminhoda unificação e transformação da UNITA. É um caminho que teve o seu ponto alto no congresso que elegeu o Sr. Samakuva como presidente da UNITA. A unidade daUNITA permanece difícil, com altos e baixos…

Quatro anos depois…A paz é uma realidade inquestionável. O mérito do presidente da república, o engenheiro José Eduardo dosSantos, na conquista da paz militar é incontornável.Os frutos da paz são visíveis na livre circulação de pessoas e bens, na reabilitação das infra-estruturas, na estabilização macro-económica, na corrida de investidores estrangeiros…

Quatro anos depois…A defesa e garantia dos direitos e liberdades fundamentais dos angolanos é feita de modo tímido ou insipiente. A igualdade perante a lei é uma miragem, para a maioria dos angolanos. A juventude rural e das periferias das grandes cidades continua condenada a um desemprego crónico, quando não está sub-empregada. Os salários da função pública permanecem aquém do custo de vida…

Quatro anos depois…Continuamos a espera da normalização das instituições políticas do país. As eleições continuam no segredodos deuses. A oposição e o partido no poder continuam com agendas desencontradas. As grandes questões nacionais ainda são monopólio e privilégio dos“iluminados” dos partidos, “grandes intérpretes” do pensar e sentir nacional. O investimento na educação ena saúde, que mais não são senão o investimento no Homem Angolano e no futuro do país, são uma miragem.

Quatro anos depois…A UNITA ainda vive os seus dramas e o sonho de ser omaior partido da oposição. A FNLA continua a braços coma sua crise interna de liderança. Os outros todos não inspiram segurança enquanto alternativa ao governo doMPLA… Por esse andar, quando as eleições forem anunciadas, não é muito difícil prever que sirvam para confirmar o óbvio…

Quatro anos depois…Consola-me saber que pesa sobre a nossa geração,gravemente privada de oportunidades, o desafio detrabalhar e lutar por uma democracia pluralista emAngola e não apenas eleitoral. Esse desafio já começoue temos de procurar pelas oportunidades já que elastardam em aparecer ou manifestar-se de forma clara etransparente.
Eu acredito na nossa geração…

Upindi Pacatolo